top of page

Sarrabulho. Foto: Gustavo Sampaio.

A culinária cearense está inserida no contexto da culinária do Nordeste, que se divide principalmente em duas vertentes: litoral e sertão. Esta, o Sertão, compõe o cardápio do Mercado São Sebastião, onde podemos encontrar seus pratos mais típicos. Ele é o verdadeiro polo gastronômico da culinária sertaneja em Fortaleza, com pratos vendidos a preços populares e com simpática informalidade.

 

Mas o que é a comida do sertão? Nos livros que descrevem historicamente a gastronomia brasileira, são recorrentes as referências à influências europeias, mouras, africanas e indígenas na sua formação. No sertão nordestino, especificamente,  essas influências encontraram condições que constituíram uma culinária própria, motivada pelo clima semiárido da região, seco e quente. A chamada "Civilização da Seca" tem uma culinária peculiar, fruto da mistura de etnias que se encontraram ainda no início da colonização do Brasil.

 

"A culinária da Civilização da Seca tem sua origem ainda no período colonial. Diferente de todas as outras existentes no Brasil, possui o colorido, o sabor e o aroma da natureza tropical. Seus pratos típicos apresentam gostos peculiares, aparências atraentes e odores fortes, inigualáveis. Ela surgiu no Nordeste Seco como uma estratégia de sobrevivência durante as calamidades climáticas, por ser a única possível de ser feita nesta região atormetada pelas secas, com o aproveitamente dos alimentos básicos (...) que já eram consumidos pelos tapuias que já habitavam essa vasta área quente e seca do nordeste brasileiro. Com os produtos da terra e as receitas e práticas alimentares trazidas pelos povos que aqui passaram a viver (europeu e africano), surgiu a culinária cabocla do sertão nordestino, que foi condicionada pelo clima semiárido tropical, especialmente pelas secas periódicas e catrastróficas, e formada pela adaptação à região da coziha herdada dos colonizadores portugueses, da cozinha africana, trazida pelos escravos negros, e do modo de preparar a cozinha nativa dos tapuias. De maneira que oimperativo climático e a integração do homem à terra fizeram surgir esta culinária tão singular, tão diferente e tão apreciada por todos que a experimentam até hoje". (MENDES, Benedito Vasconcelos. Culinária Sertaneja. Edição: Sarau das Letras Editora Ltda., em parceria com o Museu do Sertão. Mossoró-RN, 2015. p. 18-19).

 

Ainda sobre a formação da gastronomia do sertão nordestino, é importante destacar a influência dos Mouros na culinária portuguesa. Esta influência, quantro introduzida no Brasil traduzida em pratos e hábitos, acomodou-se bem na região nordeste. No livro Multissabores - a formação da gastronomia brasileira, da editora Senac, conhecemos um pouco dessa referência:

 

"A região que mais tarde se constituiria nos reinos de Portugal e Espanha passou a viver, durante séculos, sob o domínio de mulçulmanos, árabes e berberes, a quem os europeus se referiam, genericamente, como Mouros. Essa longa dominação fez com que os povos ibéricos assimilassem diversas caractéristicas culturais dos invasores, que depois foram transplantadas para as colônias".(...) Os árabes, tidos como excelentes comerciantes e dotados de faro para os negócios, corriam o mundo conhecido na ocasião atrás de mercadorias que pudessemlhes proporcionar bons lucros. (...) Levaram de seus países o hábito de consumir carnes de carneiro e cabrito, e de saborear a coalhada, obtida principalmente do leite de ovelhas e cabras. Foram eles também que apresentaram aos europeus a cana de açúcar. Grandes apreciadores de alimentos doces, transmitiram aos povos sob sua dominação receitas que se tornaram muito populares. Com os Mouros, os portugueses aprenderam a fazer o arroz doce, chamado roz bi habib, e o manjar, que tinha o nome de mualabie. Durante a colonização lusitana, vários desses traços da cultura aárabe afloraram no Brasil e muitos permanecem até hoje. Na vestimenta, o costume nordestino de usar sandálias de couro, as alpercatas. No urbanismo, a instalação de fontes, bicas e chafarizes em logradouros públicos. Entre os hábitos alimentares, o grande consumo de refresco de frutas ou mesmo de água com açúcar."

 

No entanto, apesar das inúmeras referências a esse encontro de culturas que teria formado a culinária brasileira,  e por consequência a nordestina e a sertaneja, essa não é uma ideia inconteste. Carlos Alberto Dória levanta um debate interessante sobre essa questão no livro A Formação da Culinária Brasileira - escritos sobre a cozinha inzoneira (Editora Três Estrelas, 2014). O autor questiona a explicação "confortável" e "simplista" da miscigenação:

 

"Nos últimos quinhentos anos travou-se, no território brasileiro, um enorme encontro de culturas - centenas de etnias indígenas; dezenas de etnias africanas transplantadas para cá; portugueses e europeus  de outros países - cujo resultado está longe de ser linear. A ideia de miscigenação pode ser muito confortável, mas é um conceito carente de poder explicativo. Marcas da origem disparatada de nossa culinária são visíveis em largas porções do nosso território, ao passo que poucas coisas que realmente a expressam puderam ganhar corpo e se fixar numa síntese. Alguns autores, como Câmara Cascudo, entendem que entre os séculos XVI e XVIII um substrato comum se estabilizou, formando um "gosto" nacional, que ele chama de "cozinha brasileira". Porém, se olharmos do presente para trás, veremos que muitas coisas a que nos apegamos não estavam representadas naquele período. Um só exemplo bastaria: o afrancesamento de nossa culinária, que ocorreu aolongo do século XIX e XX, e se tornou uma influência tão legítima como as anteriores. Na corte, nos livros de cozinha que a elite lia, nos primeiros café e restaurante do Rio de Janeiro ou de Pernambuco, procurava-se respirar o clina culto que todo o mundo ocidental identificava em Paris. Mesmo na culinária portuguesa, vista comouma matriz brasileira, os hábitos franceses se faziam presentes dentro das panelas." (DÓRIA).

 

Ao longo desta pesquisa, porém, nos valemos muito de Câmara Cascudo e de suas referências ao que ele chama de gosto nacional. O folclorista foi quem melhor descreveu os pratos que pesquisamos e apresentou dados históricos sobre os mesmos.

 

Nas páginas a seguir, você encontra informaçoes sobre alguns dos principais pratos típicos encontrados no São Sebastião e de seus restaurantes.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

bottom of page